Engana-se quem acha que Moonlight: Sobre a luz do luar é um filme estritamente sobre gueto, sobre a cultura negra nos Estados Unidos. O filme vai além, é um daqueles filmes para sempre, atemporais, que pode ser visto em 3017, que ainda sim alcançara a mente das pessoas. Ao mesmo tempo o filme conta a história de um menino pobre, muito próximo ao submundo das drogas, que na maioria das vezes é a realidade dos guetos estadunidenses.
Em Moonlight temos a história de Chiron, dividida em três belíssimas partes, sua infância (“Little”), adolescência (“Chiron”) e fase adulta (“Black”). Vamos acompanhando sua jornada de autoconhecimento corporal e social, tentando não se deixar levar ao crime e ao uso das drogas.
O início do filme é uma alegoria chocante e realista sobre o que é vivido por inúmeras crianças pobres nas ruas de Miami, Chiron, ainda criança, interpretado por Alex R. Hibbert vive com sua mãe, uma viciada em drogas, e nesse contexto conhece Juan (Mahershala Ali), um traficante, mas que por algum motivo alheio a nós, se sensibiliza com a situação de Chiron, que fugia do ataque de outros meninos. É esse o gatilho inicial para a trama. A amizade criada entre Chiron, Juan e Teresa (Janelle Monáe), esposa do traficante, é o primeiro combustível impulsionador da história.

Mahershala Ali
As descobertas feitas pelo nosso protagonista, vão desde seu primeiro encontro com o mar, até um entendimento mais complexo de que posições sociais Juan, sua mãe e ele mesmo ocupam naquele momento. Tudo muito bem ambientado, numa atmosfera fria e conturbada. Ainda na infância somos apresentados a Kevin, único amigo de Chiron.
O roteiro irá tratar de três temáticas muito importantes, que irão guiar os caminhos traçados por Chiron. Sua sexualidade, questões culturais negras e a devastação que as drogas podem causar a uma pessoa, no caso a sua mãe. Cada uma com sua precisão e seu destacamento necessário. A sexualidade entre ele e Kevin é apresentada de forma natural, livre, sem ser piegas, é tudo muito fluido. Em contra partida, a homofobia é algo extremamente nocivo e presente nas sociedades em geral, e por muitos momentos o nosso protagonista será alvo de tal, desde sua fase infantil até a adolescência.
A fase “Chiron” é talvez a melhor desenvolvida pelo roteiro. Não há a necessidade de se criar estereótipos, tampouco há a vontade de desconstruir algum. O filme foca na vida e história de um simples adolescente de Miami. Mas quando digo simples, não tenho a intenção de achar que a vida de Chiron é comum, muito pelo contrário, a homofobia sofrida, o comportamento da sua mãe, a amizade com Juan e Teresa, seu próprio jeito de ser, tudo isso formam elementos suficientes para tornarem a condição dele única.
Já adulto Chiron se vê chefe do tráfico de alguma localidade, posição completamente inimaginável pelo adolescente que fora um dia. Porém assim como em todo momento de sua vida, ele ainda não conseguiu descobrir quem de fato ele é, o que de fato ele deseja e o porquê se tornou o que é. São todos questionamentos muito bem orquestrados pela produção do filme, vemos no olhar de cada ator que o interpreta, um vazio, uma dúvida e uma imensa solidão, já que o mesmo foi privado de uma figura paterna, privado de relacionamentos amorosos, de um bom convívio familiar. O filme demonstra amargamente como é difícil viver a vida de Chiron.
O filme é dirigido e roteirizado pelo Barry Jenkins, que cria um roteiro muito competente na construção de personagens e nos seus desenvolvimentos, porém por mais que tenhamos algumas falas marcantes e tocantes, ele pontua toda a história com intensos momentos de silêncio, onde nenhuma palavra conseguiria exprimir o sentimento demonstrado, ele introduz uma lágrima escorrendo, um olhar amedrontado, uma respiração mais forte, enfim, o roteiro é bastante coeso naquilo que se propõe ser, não à toa Moonlight está indicado ao Oscar de Melhor Roteiro Adaptado.
Sobre a direção do filme, também indicada ao Oscar 2017, faço apenas elogios. O uso da câmera é inventivo, participativo em alguns momentos, a direção de atores é muito boa, já que muitos personagens são interpretados por mais de um ator, cabe à direção manter o padrão e o tom desejado, e isso é incrivelmente alcançado. A fotografia, outra categoria indicada, é belíssima, conversa muito bem com o roteiro, são alguns close-up’s bem feito para reforçar os momentos de silêncio, uma cor mais brilhosa quando ele já é adulto e tons mais acinzentados quando ele está na infância, ajudam a contar a condição financeira dele.
Sobre as atuações tenho que obviamente destacar Mahershala Ali, ator con

Naomie Harris
hecido no Brasil pelas séries da Netflix, House of Cards e Luke Cage. Ele, mesmo não atuando o filme todo, está impecável, cada sorriso, cada expressão mais sisuda é feita no momento certo, ele entrega sua alma ao personagem, fica bastante nítido perceber isso, é o meu favorito ao Oscar de melhor ator coadjuvante. Pelo lado feminino também temos uma atuação estupenda. Naomie Harris, a mãe de Chiron, faz uma viciada em drogas louca, compulsiva, perigosa e ciumenta, mas que velhice demonstra muito afeto e carinho pelo filho. Trevante Rhodes, que interpreta Chiron na fase adulta também merece seu destaque, por tratar de sua estreia nas telonas, pegar um papel tão dramático e complexo não é fácil.
Moonlight: Sob a luz do luar é um filme muito tocante, onde temos a real noção de como o meio a nossa volta pode nos levar a cometer ações que inicialmente não queríamos e como podemos nos tornar aquilo que não queríamos, mas sim aquilo que por necessidade viramos. Não falta quase nada a esse filme, ele tem emoção, amor, entrega e muita qualidade, talvez apenas fiquemos necessitados de um expurgo por conta de Chiron.
NOTA: 9,7
Lançamento: 21 de Outubro de 2016 (EUA) / 23 de Fevereiro de 2017 (Brasil)
Gênero: Drama
Diretor: Barry Jenkins
Roteiro: Barry Jenkins
Distribuidora: Diamond Films