O Brasil tem um ótimo histórico com produções de filmes que envolvam a polícia no seu roteiro. São exemplos disso, Tropa de Elite, Cidade de Deus, 2 Coelhos, entre outros. A divulgação e o marketing envolvendo o filme Sob Pressão, também apontava para esse lado, ainda mais após a polêmica envolvendo o programa da TV Globo, Encontro com Fátima. Quem for ao cinema esperando algum debate filosófico ou existencial sobre a polêmica do conflito moral, pode se decepcionar um pouco, o filme não se prende a isso.
A produção do diretor Andrucha Waddington tem como centro narrativo o Dr. Evandro (Júlio Andrade) e sua equipe, a Unidade Vermelha. Na equipe estão presente também, o Dr. Paulo (Ícaro Silva) e Dra. Carolina (Marjorie Estiano). A equipe passa por dia muito tenso no hospital em que trabalham, onde devem realizar três cirurgias muito delicadas: um traficante, um policial e uma criança, sendo que há apenas dois leitos de cirurgia. O que complica tudo é que todos foram baleados durante um tiroteio na favela. E ai então, Dr. Evandro e sua equipe se veem pressionados a tomarem as decisões mais rápidas e que consigam agradar as pessoas que os pressionam.
O filme é rápido, acelerado, mas comete um erro capital, no início tudo é falado, os diálogos subestimam o expectador, a intenção do roteiro era não deixar o público perdido com tanta coisa acontecendo em tela, mas não era necessário. O caos da “medicina de guerra” é apresentado nos 10 primeiros minutos, onde o famoso dilema aparece e é resolvido pelo Dr. Evandro, não havendo maiores delongas com conflitos morais, mas sim focando nas consequências da sua escolha. O tempo todo o filme tenta te mostrar, mesmo que de forma inverossímil, como é um pandemônio a emergência de um hospital público do Rio de Janeiro.
Há claramente um enfrentamento de interesses nas ações dos médicos. A polícia exige a operação do policial ferido, o tráfico ameaça invadir o hospital, o pai da criança, um jornalista influente, diz que irá detonar a reputação do hospital caso seu filho não seja atendido antes de todos. O diretor do Hospital, Dr. Samuel (Stepan Nercessian) e a administradora Ana Lúcia (Andrea Beltrão) ficam no meio do “fogo cruzado” entre os pressionadores e os pressionados, tentando fazer com que a equipe médica tenha o mínimo de autonomia.

Sob Pressão faz jus ao seu nome, o filme não dá tempo de você relaxar, são sucessivos problemas que equipe médica tem que lidar, desde a falta de material e equipamento, até a falta de energia elétrica. Sempre que a história ruma para uma provável tranquilidade, uma reviravolta acontece e intensifica do clima de tensão, e tudo isso é muito bem feito.
A ambientação é perfeita, desde o cenário, o figurino, até o uso improvisado de um celular como lanterna durante uma cirurgia, passando pelo corte do bisturi na pele dos pacientes e chegando numa fitinha que segura os óculos do Dr. Evandro. Existiu aqui uma grande preocupação com os detalhes.
Talvez o erro mais grave do filme seja a tentativa de encontrar uma empatia e um desenvolvimento de personagem. O roteiro tenta aprofundar-se em detalhes da vida dos médicos da Unidade Vermelha, rolando até um romance, que no meio de toda tensão soa estranho e totalmente fora do lugar. As interações profissionais, durante resolução de problemas, cirurgias e procedimentos, são praticamente perfeitas, porém o ritmo frenético do filme não deixa com que as relações pessoais sejam minimamente naturais, todas soam forçadas ou mal construídas. Não houve tempo para tais construções.
A direção usa muitos cortes e closes nos atores para demonstrar bem a emoção do momento, há tomadas de pequenos planos sequência, onde os médicos passeiam pelos corredores e as câmeras os seguem ou chegam primeiro no local de destino dos personagens, tudo para realçar a sensação de caos e correria. Os atores exprimem muita vontade em fazer bons papeis. E alguns até conseguem. Júlio Andrade está muito bem, demonstra muito bem a responsabilidade de salvar vidas, sejam elas quais forem, mesmo tendo suas falhas em cenas mais enérgicas, ele entende bem seu personagem. Ícaro Silva e Stepan Nercessian estão com muita vontade, mas o roteiro os atrapalham, ao contrário do colega anteriormente citado, os dois não falham em cenas mais intensas, mas na hora de dramas maiores, ambos deixam a desejar. As mulheres deste filme, Marjorie Estiano e Andrea Beltrão estão muito normais e suas personagens são genéricas, a Dra. Carolina é uma médica à moda Dr. House e Ana Lúcia recebe uma atuação robótica e sem emoção.
Sob Pressão acaba atirando para todos os lados, e se perde em um determinado momento. O filme começa querendo ser algo, trazendo denuncia sobre o estado dos hospitais públicos, traz à tona um dilema moral, tem metáforas sobre questões sociais e acaba sendo um filme tenso sobre um médico viciado em trabalho. Um pouco mais de foco e Sob Pressão poderia se juntar a lista de excelência em que Tropa de Elite e Cidade de Deus estão, mas a sua execução não chegou lá, existia uma boa premissa, mas o cinema não é feito apenas de boas ideias, é preciso desenvolvê-las.
Nota: 6,3
Lançamento: 17 de novembro de 2016
Gênero: Drama
Diretor: Andrucha Waddington
Roteiro: Renato Fagundes/Leandro Assis
Distribuidora: H2O Filmes